segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Pobre bailarina...

Sempre que ouço uma canção, ocorre algo em mim. Algo se move e me leva para o meu íntmo e permito que ela faça parte de mim. Começo então, instintivamente a construí-la dentro de mim e pouco a pouco as personagens vão ganhando rosto ou história. E se isso não ocorre, a canção desaparece e não fica ecoando em mim.
No último final de semana, estive no Curso de expressão & voz e minha professora pediu para eu cantar Ciranda da Bailarina. Essa canção é tão boa, fala tanto do lado humano e sempre me remete as minhas misérias e me recordam que sou de carne e osso.
Então, para interpretar bem a canção, eu precisaria imaginar a bailarina, minha professora sugeriu que imaginasse a bailarina como uma fresca, uma chata. Achei engraçado e tentei associá-la a alguém chata e a única que pude me lembrar foi a senhora Medlock do Jardim secreto (se você ainda não assistiu, gaste um tempo e assista, assim me entenderá melhor). Puxa, essa personagem é bem chata, me dá até raiva em certos momentos.
Apesar de tudo, foi em vão. Não consegui cantar desdenhando a bailarina.
Após cantar, minha professora me disse, "você não pode ser tão bonzinho com a bailarina". Realmente, no exercício proposto eu não poderia ser bonzinho mesmo, pois devia demonstrar que estava indignado com a tal bailarina sobre a qual fala a canção de Chico Buarque. Puxa! Não consegui mesmo!
Fonte da imagem: http://www.weheartit.com
Voltei ao meu lugar, então, meu amigo e colega de curso me disse, "você foi tão doce com a bailarina". Eu fiquei tão inquieto com isso, por não conseguir utilizar o sentimento certo na canção. Isso me tirou o sossego! Dizem que nós homens somos mais lentos para interpretar nossos sentimentos, realmente somos, risos. Acho que foi por isso que só me dei conta do motivo dessa incapacidade quando já estava em chegando em casa.
Já havia ouvido essa canção tantas vezes e um sentimento determinado já permeava minha alma e era exatamente o oposto do que eu devia apresentar. A bailarina sempre me despertou pena.
Pena??? Sim! Pena! E como eu conseguiria destratá-la se para mim ela é uma personagem digna de pena.
A bailarina da canção, não tem marca de bexiga ou vacina, nunca ficou doente, nunca se machucou, nunca namorou, não sentiu medo de cair, subir, vertigem... Aparentemente ela é um ser etéreo! Então porque sinto pena??
Sinto, porque ela nunca viveu de verdade! Nunca ficou doente, porque nunca se permitiu brincar numa gelada chuva num dia quente. Nunca teve cascas de feridas, pois nunca se machucou e nunca se machucou porque nunca brincou de verdade. Nunca sentiu medo porque nunca valorizou sua existência. Nunca se apaixonou.
Ela nunca se permitiu viver tudo isso, nunca experimentou a dor de uma queda e alegria de curar-se. Nunca sentiu seu coração partido por um amor não correspondido e teve que proucurar um outro amor. Nunca pegou uma doença porque nunca se sujou na terra ou rolou na grama. Nunca teve micose porque não rolou em um monte de areia. Somos reais e temos muita história, cheia de vida, só a bailarina que não tem.
Sei que vou demorar um tempo para sentir desprezo pela pobre da bailarina. Mas estou na batalha para conseguir isso. Quanto à bailarina, espero que algum dia ela perceba o quanto é bom viver!


sábado, 17 de março de 2012

Carrego seu coração comigo...

Dedico esse belo poema a todos que amo.


"Eu carrego o seu coração comigo
Eu o carrego no meu coração
Nunca estou sem ele
Onde quer que vá, você vai minha querida

E o que quer que eu faça sozinho
faço por você, minha querida

Não temo o meu destino
Porque você é o meu destino, meu doce

Eu não quero o mundo por mais belo que seja
Porque você é meu mundo, minha verdade
Este é o maior dos segredos que ninguém sabe

Você é a raiz da raiz
O botão do botão
E o céu do céu
De uma árvore chamada vida
Que cresce mais alto do que a alma pode esperar
Ou a mente pode esconder

E esse é o milagre
Que mantém as estrelas à distância

Eu carrego o seu coração comigo
Eu o carrego no meu coração."

(Tradução livre do poema “I carry your heart with me” de E.E. Cummings)

domingo, 15 de janeiro de 2012

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Três dias para ver

Tudo hoje em dia está em ritmo tão frenético, que acompanhamos esse ritmo e deixamos de perceber o mundo que está ao nosso redor. Sou um desses, confesso. Tenho a sensação de que os meus dias têm passado como se fossem apenas minutos e... isso é muito assustador! Isso me dá receio de não parar a tempo de perceber que estou vivendo! Isso seria engraçado se não fosse trágico, pois, é como se estivésse deixando a vida passar sem sentí-la e sem vivê-la. Não sei se você que me lê se sente assim, mas, vou tentar fazer um favor para você e para mim, publicando um texto de Helen Keller, cega e surda (isso mesmo que você leu) ela percebeu o mundo muito melhor que nós. Já aviso que o texto é longo, mas vale muito a pena. Convido-lhe a apreciar comigo:

"Várias vezes pensei que seria uma benção se todo ser humano, de repente, ficasse cego e surdo por alguns dias no principio da vida adulta. As trevas o fariam apreciar mais a visão e o silencio lhe ensinaria as alegrias do som.
De vez em quando testo meus amigos que enxergam para descobrir o que eles vêem. Há pouco tempo perguntei a uma amiga que voltava de um longo passeio pelo bosque o que ela observara. “Nada de especial”, foi à resposta.
Hellen Keller
Como é possível, pensei, caminhar durante uma hora pelos bosques e não ver nada digno de nota? Eu, que não posso ver, apenas pelo tato encontro centenas de objetos que me interessam. Sinto a delicada simetria de uma folha. Passo as mãos pela casca lisa de uma bétula ou pelo tronco áspero de um pinheiro. Na primavera, toco os galhos das árvores na esperança de encontrar um botão, o primeiro sinal da natureza despertando após o sono do inverno. Por vezes, quando tenho muita sorte, pouso suavemente a mão numa arvorezinha e sinto o palpitar feliz de um pássaro cantando.
Às vezes meu coração anseia por ver tudo isso. Se consigo ter tanto prazer com um simples toque, quanta beleza poderia ser revelada pela visão! E imaginei o que mais gostaria de ver se pudesse enxergar, digamos por apenas três dias.
Eu dividiria esse período em três partes. No primeiro dia gostaria de ver as pessoas cuja bondade e companhias fizeram minha vida valer a pena. Não sei o que é olhar dentro do coração de um amigo pelas “janelas da alma”, os olhos. Só consigo “ver” as linhas de um rosto por meio das pontas dos dedos. Posso perceber o riso, a tristeza e muitas outras emoções. Conheço meus amigos pelo que toco em seus rostos.
Como deve ser mais fácil e muito mais satisfatório para você, que pode ver, perceber num instante as qualidades essenciais de outra pessoa ao observar as sutilezas de sua expressão, o tremor de um músculo, a agitação das mãos. Mas será que já lhe ocorreu usar a visão para perscrutar a natureza íntima de um amigo? Será que a maioria de vocês que enxergam não se limita a ver por alto as feições externas de uma fisionomia e se dar por satisfeita?
Por exemplo, você seria capaz de descrever com precisão o rosto de cinco bons amigos? Como experiência, perguntei a alguns maridos qual a exata cor dos olhos de suas mulheres e muitos deles confessaram, encabulados, que não sabiam.
Ah, tudo que eu veria se tivesse o dom da visão por apenas três dias!
O primeiro dia seria muito ocupado. Eu reuniria todos os meus amigos queridos e olharia seus rostos por muito tempo, imprimindo em minha mente as provas exteriores da beleza que existe dentro deles. Também fixaria os olhos no rosto de um bebê, para poder ter a visão da beleza ansiosa e inocente que precede a consciência individual dos conflitos que a vida apresenta. Gostaria de ver os livros que já foram lidos para mim e que me revelaram os meandros mais profundos da vida humana. E gostaria de olhar nos olhos fiéis e confiantes de meus cães, o pequeno scottie terrier e o vigoroso dinamarquês.
À tarde daria um longo passeio pela floresta, intoxicando meus olhos com belezas da natureza. E rezaria pela glória de um pôr-do-sol colorido. Creio que nessa noite não conseguiria dormir.
No dia seguinte eu me levantaria ao amanhecer para assistir ao empolgante milagre da noite se transformando em dia. Contemplaria assombrado o magnífico panorama de luz com que o Sol desperta a Terra adormecida.
Esse dia eu dedicaria a uma breve visão do mundo, passado e presente. Como gostaria de ver o desfile do progresso do homem, visitaria os museus. Ali meus olhos, veriam a história condensada da Terra -- os animais e as raças dos homens em seu ambiente natural; gigantescas carcaças de dinossauros e mastodontes que vagavam pelo planeta antes da chegada do homem, que, com sua baixa estatura e seu cérebro poderoso, dominaria o reino animal.
Minha parada seguinte seria o Museu de Artes. Conheço bem, pelas minhas mãos, os deuses e as deusas esculpidos da antiga terra do Nilo. Já senti pelo tato as cópias dos frisos do Paternon e a beleza rítmica do ataque dos guerreiros atenienses. As feições nodosas e barbadas de Homero me são caras, pois também ele conheceu a cegueira.
Assim, nesse meu segundo dia, tentaria sondar a alma do homem por meio de sua arte. Veria então o que conheci pelo tato. Mais maravilhoso ainda, todo o magnífico mundo da pintura me seria apresentado. Mas eu poderia ter apenas uma impressão superficial. Dizem os pintores que, para se apreciar a arte, real e profundamente, é preciso educar o olhar. É preciso, pela experiência, avaliar o mérito das linhas, da composição, da forma e da cor. Se eu tivesse a visão, ficaria muito feliz por me entregar a um estudo tão fascinante.
À noite de meu segundo dia seria passada no teatro ou no cinema. Como gostaria de ver a figura fascinante de Hamlet ou o tempestuoso Falstaff no colorido cenário elisabetano! Não posso desfrutar da beleza do movimento rítmico senão numa esfera restricta ao toque de minhas mãos. Só posso imaginar vagamente a graça de uma bailarina, como Pavlova, embora conheça algo do prazer do ritmo, pois muitas vezes sinto o compasso da música vibrando através do piso. Imagino que o movimento cadenciado seja um dos espetáculos mais agradáveis do mundo. Entendi algo sobre isso, deslizando os dedos pelas linhas de um mármore esculpido; se essa graça estática pode ser tão encantadora, deve ser mesmo muito mais forte a emoção de ver a graça em movimento.
Na manhã seguinte, ávida por conhecer novos deleites, novas revelações de beleza, mais uma vez receberia a aurora. Hoje, o terceiro dia, passarei no mundo do trabalho, nos ambientes dos homens que tratam do negócio da vida. A cidade é o meu destino.
Primeiro, paro numa esquina movimentada, apenas olhando para as pessoas, tentando, por sua aparência, entender algo sobre seu dia-a-dia. Vejo sorrisos e fico feliz. Vejo uma séria determinação e me orgulho. Vejo o sofrimento e me compadeço.
Caminhando pela 5ª Avenida, em Nova York, deixo meu olhar vagar, sem se fixar em nenhum objeto em especial, vendo apenas um caleidoscópio fervilhando de cores. Tenho certeza de que o colorido dos vestidos das mulheres movendo-se na multidão deve ser uma cena espetacular, da qual eu nunca me cansaria. Mas talvez, se pudesse enxergar, eu seria como a maioria das mulheres – interessadas demais na moda para dar atenção ao esplendor das cores em meio à massa.
Da 5ª Avenida dou um giro pela cidade – vou aos bairros pobres, às fábricas, aos parques onde as crianças brincam. Viajo pelo mundo visitando os bairros estrangeiros. E meus olhos estão sempre bem abertos tanto para as cenas de felicidade quanto para as de tristeza, de modo que eu possa descobrir como as pessoas vivem e trabalham, e compreendê-las melhor.
Meu terceiro dia de visão está chegando ao fim. Talvez haja muitas atividades a que devesse dedicar as poucas horas restantes, mas acho que na noite desse último dia vou voltar depressa a um teatro e ver uma peça cômica, para poder apreciar as implicações da comédia no espírito humano.
À meia-noite, uma escuridão permanente outra vez se cerraria sobre mim. Claro, nesses três curtos dias eu não teria visto tudo que queria ver. Só quando as trevas descessem de novo é que me daria conta do quanto eu deixei de apreciar.
Talvez este resumo não se adapte ao programa que você faria se soubesse que estava prestes a perder a visão. Nas sei que, se encarasse esse destino, usaria seus olhos como nunca usara antes. Tudo quanto visse lhe pareceria novo. Seus olhos tocariam e abraçariam cada objeto que surgisse em seu campo visual. Então, finalmente, você veria de verdade, e um novo mundo de beleza se abriria para você.
Eu, que sou cega, posso dar uma sugestão àqueles que vêem: usem seus olhos como se amanhã fossem perder a visão. E o mesmo se aplica aos outros sentidos. Ouça a música das vozes, o canto dos pássaros, os possantes acordes de uma orquestra, como se amanhã fossem ficar surdos. Toquem cada objeto como se amanhã perdessem o tato. Sintam o perfume das flores, saboreiem cada bocado, como se amanhã não mais sentissem aromas nem gostos. Usem ao máximo todos os sentidos; goze de todas as facetas do prazer e da beleza que o mundo lhes revela pelos vários meios de contato fornecidos pela natureza. Mas, de todos os sentidos, estou certa de que a visão deve ser o mais delicioso."

Esse texto é unico e muito rico.
E então, está pronto para diminuir o ritmo enquanto ainda há tempo para isso?
Vivamos!

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Poços escondidos...

Se observarmos nosso mundo detidamente, corremos o risco de nos assustarmos. Perceberemos como ele pode ser desprovido de beleza e de poesia. Não me refiro ao planeta, pois ele em sua natureza é belo. Mas, me refiro a humanidade. 
Temos vivido como que envoltos em uma poeira, ou neblina, que bloqueia nossos sentidos e ficamos como entorpecidos e esquecidos do que é real.
Créditos da imagem:
http://viagensdemarilene.blogspot.com/
Nesse momento há homens que não podem por sua cabeça no travesseiro para ter uma noite de descanso, pois estão envoltos em uma guerra e se ousarem dormir, podem já não acordar. Há mulheres que secretamente choram pois seus seios secaram e já não podem prover a única fonte de alimento que conseguia oferecer a seu filho. Há crianças que nunca souberam o que é a alegria do riso e de uma brincadeira; e ao invés de uma boneca ou peão tem uma enxada e uma foice em lugar de um brinquedo. Há homens que exploram os pobres e se divertem esbanjando o dinheiro obtido dessa exploração. Há filhos que abandonam seus pais em asilos porque eles já se tornaram um peso “morto” e não consideram com mais valor.  Há aqueles que desistem de lutar porque percebem quanta crueldade existe.
Isso tudo é real. Mas não é tudo! Tudo isso existe, mas não é unicamente isso.  Se observarmos mais um pouco, e abrirmos nossos olhos começaremos a enxergar através da poeira e nossos sentidos se abrirão para uma realidade que nos permite crer que há beleza.
A beleza está nos homens que entregam sua vida para que uma guerra termine ou se sacrificam em nome de muitos para que o bem ocorra. Está em mulheres e homens fortes que mesmo sem recursos lutam para salvar vidas de crianças subnutridas. Está no coração daqueles que lutam contra toda forma que opressão e exploração que possa existir. Está naqueles que ensinam seus filhos que não se envelhece, mas sim se fica experiente e sábio.  Está nos que lutam para que o pobres tenham uma vida mais digna. Está naqueles que não deixam de crer que em nosso mundo há corações repletos de bondade, honra, lealdade, fé e grandeza. Está naqueles que lutam para despertar as pessoas e mostrar que é possível ainda crer e que é preciso ainda crer.
Saber que em meio a tanta aridez de nosso mundo existe esse bálsamo é o que o torna belo!
Posso dizer que entendi o que Exupéry quis dizer quando escreveu:  “O que torna belo o deserto é que ele esconde um poço nalgum lugar.”
Que Deus nos ajude a sermos esse poços escondidos em algum lugar...

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A menina...



Créditos da imagem: http://www.imagebank.com/
 
Havia despertado cedo aquele dia, não porque quisesse, mas porque sonhara. Não era nada de extraordinário, mas em seu sonho comia vorazmente um pedaço saboroso de pão enquanto brincava com sua boneca de olhos azuis. Porém quanto mais comia mais sentia seu estômago doer, dando-lhe a sensação de não estar saciada. Essa dor fez-lhe despertar... Ao dar-se conta de que despertara percebeu que a dor era real e estava faminta.  A situação financeira de sua família não era fácil ultimamente, mal conseguiam dinheiro para qualquer alimento. Lembrou-se então que era sete de setembro e o centro da cidade estaria repleto de pessoas devido ao dia da pátria e, por sorte, conseguiria algum dinheiro para ter o que comer... Sentia-se envergonhada e humilhada por pedir, mas o tamanho de sua fome ultrapassava o amor próprio. Por volta de meio dia, após diversas tentativas conseguiu uns poucos trocados que mal serviam para comprar alguns pães. Visou então um restaurante aberto e repleto de pessoas e resolveu arriscar-se por lá. Dentro desse restaurante havia uma família sentada à mesa aguardando sua refeição. O filho caçula, de idade pré-escolar, não conseguia conter a excitação por ter visto seu irmão e irmã desfilarem nesse ato cívico. Pedia para a mãe que o deixasse desfilar no próximo ano e sua mãe pacientemente lhe dizia “tudo a seu tempo”e “sua hora chegaria”. Eis que então o menino percebe uma menina um pouco mais velha que ele aproximar-se. Ela calçava um par remendado de chinelos de dedo, trajava uma camiseta gasta e usava uma saia simples até os joelhos.  A menina pede-lhes dinheiro. A mãe do garoto não dispunha de algum e é sincera.  A menina então afasta-se, um pouco conformada, afinal já lhe haviam negado tantas vezes. O menino então se cala. Sua excitação desaparecera instantaneamente. Ele tenta assimilar o que ocorre, mas não consegue.  Seu pensamento fica distante e o menino não consegue tirar os olhos da menina e não sabe porque. Ele não a conhece, jamais a vira. Então, percebe que dentro de seu peito brota um sentimento que jamais experimentara antes e que o deixa mais inquieto do que já esteve na vida. Ele sente que deve fazer alguma coisa, seus olhos buscam auxílio na face da mãe e ele indaga o que poderiam fazer. Com um olhar triste a mãe responde que não tinham condições de ajudá-la.  A menina segue seu caminho e continua pedindo... ela ouve os mesmos infindáveis nãos. Ainda observando a menina, o menino sente seu peito arder e ao mesmo tempo sente-se extremamente impotente. A menina pede então a um senhor de meia idade que devorava algumas batatas fritas. Por mais que precise de dinheiro, a fome é mais forte: seus olhos, cabeça e estômago voltam-se para as apetitosas batatas. O homem displicentemente diz-lhe que não tem dinheiro, mas, compadecido da situação da menina, toma um palito de dentes e o enche de batatas. Ao aceitá-lo, a menina ela não consegue conter seu sorriso de satisfação. Tão poucas batatas não extinguiriam sua fome, mas aliviariam a dor, renovando-lhe as forças prosseguir em sua luta diária. Agradecida ela se despede, levando alguns trocados e as batatas. Ela que foi ali pedir, não sabe que havia dado um presente a um menino: um sentimento novo e ele somente viria a entendê-lo quando adulto.
Nunca mais a viu, mas sua imagem ficou gravada em sua mente de maneira indelével. Vez ou outra ela ainda povoa-lhe os pensamentos e hoje ele sabe que aquela foi a primeira vez que sentiu um dos mais nobres sentimentos humanos: Compaixão.

sábado, 4 de setembro de 2010

Passos lentos de uma desconhecida

Créditos da imagem: http://www.gettyimages.com/
Vejo seus passos lentos, seu rosto cansado, seu caminhar vacilante e quase consigo ler sua história. Você traz em seu rosto muitas marcas que foram sendo delicadamente escritas pelo passar dos dias em sua face. Não sei o que você oculta e desconheço sua vida. Talvez tenha tido uma infância difícil, tendo que batalhar por ter algo para comer ou para alimentar a todos de sua casa. Talvez você tenha chorado, escondido as vezes, para não demonstrar sua fraqueza. A dor pode ter lhe dilacerado a alma quando perdeu um amor, um amigo, um filho... Muitas decepções podem ter se abatido sobre você e seu caminho. Mas ainda assim você prosseguiu até hoje. Acho que também você riu, sorriu e ainda que seu sorriso hoje seja somente um lampejo de toda a glória que foi na juventude, ainda traz nele sua esperança e sua fé, que te permite levantar dia após dia e prosseguir. Sua vida pode ter sido cercada de filhos, netos, amigos... e hoje, talvez, você esteja só, mas traz em si secretamente a satisfação de quem amou, se sacrificou pelo que achava certo e acima de tudo:viveu! Suas lágrimas marcaram sua face com os momentos de inesgotável alegria e inesperada tristeza. Vejo-lhe ainda marchar com seus passos lentos, mas com o brilho nos olhos de alguém que tem a impressão que deu seus primeiros passos da vida hoje pela manhã. Ainda traz em si a leveza e realeza que irradiava em sua mocidade. A mesma face que eu vejo, você vê no espelho; os mesmos traços que vejo são os que te saltam aos olhos e ainda assim lhe parece que sua face é aquela mesma que você mirou há muito tempo em algum espelho. E quando contempla seu reflexo, não sente arrependimento ou dor, mas sente gratidão por poder ter pisado no solo deste planeta, se consumido diariamente  e por que sempre se sentiu viva!
Você passa por mim e sorri. Retribuo timidamente seu sorriso e apresso meus passos, deixando-te para trás com seu andar despreocupado e seu jeito taciturno. Você não me conhece e muito menos eu a você. Mas, seu sorriso e seu olhar me disseram muito e reafirmaram a certeza de que viver vale a pena e no ocaso dos meus dias serei como você e trarei em mim toda minha história, e, com emoção, lembrarei que você me mostrou meu futuro da maneira mais doce que já pude provar. Talvez você nunca leia minhas palavras, ou nunca mais esbarre comigo na rua. Mas ainda assim, esse segundo de eternidade que partilhamos aqui na terra, ressoará em mim por muito tempo, quiçá por toda a minha vida. E quem sabe, qual de nós chegar primeiro na eternidade, esperará ansioso para conversar sobre aquele segundo. Agradeço a Deus por sua vida e por lhe usar para falar comigo. Que Ele lhe abençoe e nos vemos por aí.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Heróis...

É vergonhoso, não é mesmo? Estou há muito tempo sem postar aqui... Mas enfim, muita coisa tem acontecido. E há algum tempo tenho me sentido impelido a escrever de novo. Comigo o “fenômeno” da escrita se passa assim: a idéia surge em minha mente até fervilhar e então tenho a necessidade de por no papel (ou no blog) para acalmar minha mente. Porém, tenho deixado de alimentar minhas idéias até fervilharem, finjo que não as tenho e deixo passarem. Como hoje estou acamado, me permiti não ignorar minhas idéias. E a idéia do meu post de hoje começou após zapear canais e parar no filme do homem aranha 2. E toda vez que o vejo, fico com os olhos cheios de lágrimas, quando a tia May fala ao Peter sobre heróis. Reproduzo abaixo a sua fala:
“Deus sabe crianças como Henry precisam de um herói. Pessoas que se sacrificam pelo próximo, dando um exemplo pra nós. Todo mundo adora um herói. As pessoas fazem filas para vê-los, para gritar seus nomes. E daqui a uns anos eles contarão como ficaram na chuva durante horas, só pra ver de relance aquele que os ensinou a continuar acreditando. Eu acredito que exista um herói em todos nos que nos mantém honestos, que nos da forças, nos enobrece... E no fim nos permite morrer com orgulho. Ainda que às vezes tenhamos que ser firmes e desistir daquilo que mais queremos. Até de nossos sonhos.”
Lindo, não é verdade? E mais que isso: bem verdadeiro! O mais curioso é que conversava sobre heróis ontem com um amigo, como nosso mundo carece de heróis hoje em dia em nosso país. Questionava o que aconteceu com nossa gente, aonde foi parar sua garra e vontade de lutar? Quantos derramaram seu sangue ao lutar contra a ditadura? Quantos expuseram sua cara na rua para depor o presidente Collor na década de 90? E hoje em dia? Onde estão nossos heróis? Um jogador de futebol? Uma cantora? Que espécie de heróis é essa?! Para onde caminha nosso mundo?
Mas após ver essa frase da tia May, percebi que existem sim heróis, porém, anônimos. Que no silêncio do seu dia-a-dia derramam suor, lágrimas e até sangue pelo bem de outros. Que eclipsam suas vidas para que outros a tenham. Conheço pessoas assim, pessoas próximas, e tenho orgulho de chamá-las de “amigo”, de “mãe”, de “avó”, de “pai”... Pessoas que lutam de verdade por aquilo que acreditam ser correto e que nos ensinam a continuar acreditando...
Coloco abaixo um vídeo que me encanta e ao mesmo tempo me faz sentir péssimo, pois se há heroísmo em mim, está bem no fundo, mas bem no fundo mesmo! Esse vídeo não é de uma brasileira, mas de uma hispânica mas que traz a mesma história de muitos heróis e anônimos do Brasil.